Olá pessoal! Como estão?
Espero que todos estejam bem.
Essa semana, seguindo nosso tema central da semana passada, qual seja provas no processo administrativo fiscal, abordaremos um caso recentemente julgado pelo CARF.
Conforme mencionado na semana passada, durante o processo administrativo fiscal deve ser concedido às partes o direito de realizar as provas necessárias para comprovação de suas alegações.
Ocorre que além da devida atenção momento da indicação das provas ou ainda no caso de indeferimento no momento da impugnação é igualmente importante se atentar ao método usado para obtenção das provas que figuram nos autos, pois diante disso é possível verificar eventuais irregularidades na obtenção de determinada prova que por consequência pode gerar até a nulidade da autuação fiscal que embasa o processo.
Nesse âmbito se destacam as chamadas provas ilícitas, consideradas como aquelas que sua obtenção viola regras constitucionais e infraconstitucionais. A Constituição Federal em seu artigo 5°, inciso LVI prevê que são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.
Conforme Rocha (2018, p.239) "a vedação quanto à utilização das provas ilícitas no processo deriva, em princípio, do imperativo de boa‑fé que deve reinar entre as partes [...]"
Nesse contexto se insere o entendimento fixado pelo CARF no ano de 2019 e no final do mês passado quando do julgamento de recursos que tinham como questão de mérito a ilicitude das provas que serviram de ponto de partida para os casos em questão.
O julgamento de referidos recursos já tinham se iniciado em 2014 e em 2016 respectivamente, porém por unanimidade dos votos os Conselheiros decidiram converter o julgamento em diligência, motivo pelo qual só agora voltaram a ser julgados.
A base da discussão nos recursos era a lavratura de Auto de Infração decorrente da divergência no pagamento de Imposto de Importação, IPI, PIS Importação e Cofins Importação dada a ocorrência de subfaturamento, bem como a aplicação de multa e juros de mora.
Em suas razões os Recorrentes dentre outras alegações sustentaram que a autuação teve por base provas obtida ao longo da chamada “Operação Dilúvio”, mas que no processo criminal instaurado em razão da operação essas provas foram declaradas ilícitas, de modo que o mesmo tratamento deveria ser conferido a essas provas no processo administrativo fiscal. Sendo assim, nos recursos foi requerida a declaração de nulidade da autuação.
Na primeira análise de um dos recursos, quanto esse o CARF considerou que
“[...] o STJ não declarou a ilegalidade de toda prova produzida no inquérito
policial, mas apenas da interceptação telefônica no tocante às sucessivas renovações e daquela decorrente dela, estipulando ainda o prazo máximo da interceptação telefônica, qual seja, de 60 dias, desde que houvesse decisão fundamentada.
Dessa forma, torna- se imprescindível que essa turma de julgamento identifique, dentre as provas coletadas pela fiscalização, quais foram efetivamente afetadas pela decisão do STJ, separando daquelas que foram decorrentes da interceptação quando ela ainda era válida (os primeiros sessenta dias), além daquelas decorrentes de procedimentos fiscais realizados pela própria Fiscalização da Receita Federal do Brasil, dentro de sua competência legal.
Destaca-se que, no presente caso, parte das informações que levaram a
fiscalização a autuar os infratores foram obtidas no curso do procedimento fiscal. [...]” (CARF, Recurso Voluntário nº 3402-000.740. Processo nº 10611.001423/2009-59, Brasília, DF, Data da Sessão 26/01/2016.)
Sendo assim, dentre os pontos fixados para realização de diligência o CARF determinou a identificação das provas que foram produzidas independentemente da operação que originou o processo criminal, bem como a identificação de quais provas a Receita Federal poderia realizar sem autorização judicial.
No primeiro julgamento, em 2019, o CARF entendeu que seria o caso da aplicação de três princípios, quais sejam os princípios da árvore envenenada, da descoberta inevitável e da fonte independente, de modo que todas as provas que não decorreram da “Operação Dilúvio” deveriam ser mantidas, bem como aquelas que poderiam ser obtidas por meios lícitos. Vejamos:
“Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário
Período de apuração: 30/09/2004 a 03/01/2005
ATOS PRATICADOS MEDIANTE FRAUDE. COMPROVAÇÃO. PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS. PRINCÍPIO DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. PRINCÍPIO DA DESCOBERTA INEVITÁVEL. PRINCÍPIO DA FONTE INDEPENDENTE. MITIGAÇÃO. POSSIBILIDADE.
Não serão consideradas ilícitas as provas derivadas de provas ilícitas, quando ficar demonstrado que elas poderiam ser obtidas por uma fonte independente, bastando, para tanto, que se desse andamento aos trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação fiscal.” (CARF, Recurso Especial do Procurador nº 9303-008.694. Processo nº 19647.011167/2009-75, Brasília, DF, Data da Sessão 12/06/2019.)
Desse modo, naquela oportunidade ainda persistiram provas aptas para embasar o Auto de Infração, o que não ocorreu nos casos recentemente julgados pelo CARF resultando nestes, por maioria dos votos, na anulação do Auto de Infração em ambos os casos.
Portanto, conforme destacado no início de nossas considerações a análise dos meios de obtenção das provas é de suma importância para ambas partes, mas especialmente para o sujeito passivo que no caso de eventuais irregularidades poderá alegar a ocorrência desta em preliminar. Contudo, como também foi possível observar é necessário cautela para apurar se tais provas não poderiam ser realizadas ou descobertas por outros meios, pois em caso positivo a declaração de nulidade poderá não ser consequência do uso de provas ilícitas.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Recurso Especial do Procurador nº 9303-008.694. Processo nº 19647.011167/2009-75, Brasília, DF, Data da Sessão 12/06/2019. Disponível em: <https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/listaJurisprudenciaCarf.jsf> . Acesso em: 07 set. 2021.
_____. Recurso Voluntário nº 3402-000.740. Processo nº 10611.001423/2009-59, Brasília, DF, Data da Sessão 26/01/2016. Disponível em: <https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/listaJurisprudenciaCarf.jsf> . Acesso em: 07 set. 2021.
______. Recurso Voluntário nº 3402-000.643. Processo nº 10611.000960/2009-81, Brasília, DF, Data da Sessão 26/03/2014. Disponível em: <https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/listaJurisprudenciaCarf.jsf> . Acesso em: 07 set. 2021.
ROCHA, Sergio André. Processo Administrativo Fiscal: controle administrativo do lançamento tributário. São Paulo: Almedina, 2018.
ESCRITO POR ANA BEATRIZ DA SILVA
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