Por vezes frente a uma demanda que pode atingir seus bens, o devedor no intuito de ocultar seu patrimônio para que esse não seja atingido pelo processo em curso, realiza atos no sentido de transferir seu patrimônio para terceiros.
Estes atos, no entanto, constituem, embora o principal, um dos elementos para a configuração da FRAUDE À EXECUÇÃO.
Nesse sentido, vejamos o disposto no art. 790 do CPC:
“Art. 790. São sujeitos à execução os bens: [...]
V - alienados ou gravados com ônus real em fraude à execução; [...]”
Contudo, antes de adentrarmos nas considerações específicas quanto a fraude à execução, uma primeira observação é extremamente importante...
... Apenas no caso de processo de EXECUÇÃO se configura a fraude?
NÃO! A fraude à execução pode ser caracteriza na execução e no processo de conhecimento.
Além disso mais, uma ressalva é DE SUMA IMPORTÂNCIA ... a fraude à execução só se caracterizará após a ciência do devedor do processo ajuizado contra ele. OU SEJA, É PRECISO QUE O DEVEDOR JÁ TENHA SIDO CITADO NO PROCESSO.
Todavia, o credor poderá antes da citação fazer uso do disposto no art. 828 do CPC, pelo qual poderá realizar a averbação da demanda no registro dos bens do devedor como forma de se proteger, bem como proteger o resultado útil do processo.
Pois bem, passamos agora as situações em que poderá ser verificado esse ato dispostas no art. 792 do CPC:
Art. 792, CPC. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução:
I - quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver;
II - quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828 ;
III - quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude;
IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;
V - nos demais casos expressos em lei.
Sobre o dispositivo supracitado, conforme Bueno (2019, p. 313)
“A ‘fraude à execução’ de que se ocupa o art. 792 deve ser entendida como a declaração de ineficácia da alienação ou da oneração de bens que dificulta ou inviabiliza a concretização da tutela jurisdicional executiva quando dirigida ao patrimônio genericamente considerado (obrigação de pagar quantia certa) ou, mais especificamente, a um dado bem especificamente considerado no patrimônio do executado (obrigação de entrega de coisa)." (grifo nosso)
Assim, constatada a fraude à execução o ato será INEFICAZ!!
Importa destacar que a alienação ou oneração dos bens do devedor só poderá ser considerada fraude à execução no caso do devedor não apresentar outros bens que possam a saldar sua dívida.
Nesse sentido, de acordo com ALVIM, GRANADO E FERREIRA (2019, p. 1421)
“[...] a existência de ação pendente contra determinada pessoa não torna seus bens indisponíveis. Pelo contrário, o demandado continua a ter, salvo decisão judicial em sentido contrário, a livre disposição dos seus bens, sem que isso o autorize a criar ou asseverar situação de dificuldade ou verdadeira impossibilidade de serem executadas forçadamente as suas obrigações.” (grifo nosso)
MAS E O TERCEIRO?
Conforme a Súmula 375 do STJ “O reconhecimento da fraude de execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.”
Assim, havendo averbação no registro do bem resta demonstrada que houve má-fé do terceiro adquirente, mas caso contrário caberá ao credor a comprovação da má-fé, mas caso o bem não seja passível de registro a prova da não ocorrência de má-fé caberá ao terceiro.
O terceiro adquirente poderá ainda se manifestar a respeito do ato, eis que na forma do art. 792, §4º do CPC poderá esse opor EMBARGOS DE TERCEIRO.
Por fim, resta mencionar que:
1. A fraude à execução é considerada, conforme aponta a doutrina, como ato atentatório à dignidade da justiça, bem como apresenta tipificação penal no art. 179 do Código Penal.
Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.
2. A declaração da ocorrência da fraude à execução é proferida nos próprios autos.
3. A fraude à execução também se aplica a pessoa jurídica, de forma que em decorrência dessa pode ser determinada a desconsideração da personalidade jurídica (sobre essa já tratamos aqui e recomendamos a rápida leitura, dada a importância do instituto)
Portanto, como ficou demonstrado a resposta para nossa pergunta inicial é NÃO, mas como também apresentamos a cautela é fundamental para tanto para o credor, quanto para o devedor e para o terceiro adquirente.
Não procuramos esgotar todo o tema, mas apenas retratar algumas considerações para sobre a fraude à execução para demonstrar que a importância dessa quando pensamos na responsabilidade patrimonial.
REFERÊNCIAS
ALVIM, Eduardo Arruda; GRANADO, Willian; FERREIRA, Eduardo Aranha. Direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: volume 3 : tutela jurisdicional executiva. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
SÁ, Renato Montans de. Manual de direito processual civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
ANA BEATRIZ DA SILVA
ana_beatriz_silva@yahoo.com.br
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