No artigo de hoje trataremos da chamada compensação cruzada, no entanto antes de adentrarmos ao tema aproveito para relembrar que as principais considerações sobre a compensação já foram anteriormente tratadas no artigo “QUANDO SERÁ POSSÍVEL REQUERER A COMPENSAÇÃO PARA EXTINGUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO?”, por essa razão não iremos adentrar novamente nessas questões, mas convido a todos a reverem mencionado artigo.
Pois bem, passamos então ao tema central do presente artigo ... a COMPENSAÇÃO CRUZADA.
Considera-se compensação cruzada quando no âmbito da Receita Federal são feitas compensações entre créditos e débitos fazendários ou previdenciários dos contribuintes que fazem uso do Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial).
Mencionada compensação foi estabelecida pela Lei nº 13.670/2018, quando as alterações promovidas na Lei nº 11.457/2007 e posteriormente regulamentada pela Instrução Normativa RFB nº 1.810/2018, a qual também promoveu alterações na Instrução Normativa nº 1.717/2017.
Sendo assim, a compensação cruzada se originou como um instrumento apto a permitir que os contribuintes que fazem uso do eSocial possam utilizar os créditos decorrentes da apuração em valor a maior ou indevido de tributos federais administrados pela Receita Federal do Brasil para compensar os seus débitos perante o INSS relativos a contribuições previdenciárias.
MAS E OS CONTRIBUINTES QUE NÃO UTILIZAM O ESOCIAL?
Nesse caso, como o contribuinte não preenche um requisito essencial para usufruir do benefício a medida ser adotada nesse caso deverá ser pleitear a restituição do valor a fim de reaver aquela quantia paga a maior ou indevida ou utilizar de créditos de mesma natureza para efetuar a compensação.
Além disso, em que pese a compensação cruzada represente um benefício criado pela Lei nº 13.670/2018, importa destacar que são estipuladas também algumas vedações que impedem a ocorrência desta.
Desse modo, na forma do artigo 8º, § 1º da Lei nº 13.670/2018 a compensação cruzada não poderá ocorrer quando:
1. Os débitos de contribuições previdenciárias e os créditos a serem compensados fizerem referência a período posterior ao início do uso do eSocial (inciso I);
2. Débitos referentes aos demais tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal quando: (inciso II)
a) relativo a período de apuração anterior à utilização do eSocial para apuração de tributos com crédito concernente às contribuições previdenciárias;
b) com crédito das contribuições previdenciárias relativo a período de apuração anterior à utilização do eSocial para apuração das referidas contribuições.
Ainda assim, diante da possibilidade da realização da compensação a Receita Federal do Brasil foi consultada como relação ao momento em que os créditos e débitos deveriam se referir para que a compensação cruzada fosse validada, de modo que quando da Solução de Consulta DISIT/SRRF04 nº 4029, de 15 de dezembro de 2020 compreendeu a autoridade tributária que os créditos e débitos deveriam ter período de apuração posterior à utilização do eSocial. Vejamos:
Solução de Consulta DISIT/SRRF04 nº 4029, de 15 de dezembro de 2020 (Publicado(a) no DOU de 17/12/2020, seção 1, página 98) Assunto: Contribuições Sociais Previdenciárias CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PATRONAL. CRÉDITOS PREVIDENCIÁRIOS. DÉBITOS TRIBUTÁRIOS. COMPENSAÇÃO. SISTEMA DE ESCRITURAÇÃO DIGITAL DAS OBRIGAÇÕES FISCAIS, PREVIDENCIÁRIAS E TRABALHISTAS (eSocial). Somente é possível a compensação entre débitos e créditos de tributos previdenciários e não previdenciários, reciprocamente, se ambos tiverem período de apuração posterior à utilização do eSocial. SOLUÇÃO DE CONSULTA VINCULADA À SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 336 - COSIT, DE 28 DE DEZEMBRO DE 2018. Dispositivos Legais: Art. 26-a da Lei nº 11.457, de 2007; art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996; arts. 65, 76 e 84 da IN RFB nº 1717, de 2017; art. 2º da Resolução nº 2 do Comitê Diretivo do eSocial, de 2016. Assunto: Contribuições Sociais Previdenciárias INEFICÁCIA PARCIAL. A matéria consultada não trata de questão interpretativa da legislação tributária, mas sim de orientação procedimental, o que escapa ao escopo do instituto da Solução de Consulta disciplinada na IN RFB nº 1.396, de 2013, bem como não produz efeitos a consulta formulada em tese, com referência a fato genérico, que não identifique o dispositivo da legislação tributária e aduaneira sobre cuja aplicação haja dúvida e, ainda, quando tenha por objetivo a prestação de assessoria jurídica ou contábil-fiscal pela RFB. Dispositivos Legais: art. 1º e incisos II e XIV do art. 18 da IN RFB nº 1.396, de 2013. (grifo nosso)
No entanto, recentemente o tema foi também foi apreciado judicialmente quando da decisão de mandado de segurança impetrado com o fim de obter o direito de compensação de créditos de PIS e COFINS, obtidos pela exclusão desses da base de cálculo do ICMS devido pelo contribuinte, com débitos oriundos de contribuições previdenciárias devidas por este contribuinte. No caso em questão os débitos faziam referência ao um período antes da edição da lei, no entanto a constituição do crédito só ocorreu em definitivo após a edição da lei, quando o contribuinte já adotava o eSocial, razão pela qual restou decidido no caso que o contribuinte pode realizar a compensação cruzada entre os créditos de PIS e COFINS e os débitos das contribuições previdenciárias.
Portanto, é possível verificar que a compensação cruzada apresentou vantagens significativas para os contribuintes ao permitir, ainda que apenas com relação aos créditos e débitos apurados após o início da utilização do eSocial, a compensação de tributos federais com contribuições previdenciárias o que certamente facilitou e promoveu uma economia para esses contribuintes quanto aos valores desembolsados em razão de suas obrigações tributárias. Desse modo, a recente decisão também contribui para que esse cenário se torne ainda mais vantajoso tendo em vista que embora permaneçam as regras estipulas para o uso desse mecanismo restou delimitado um período exato para que compensação seja possível e validada ainda que em momento anterior o contribuinte não estivesse cadastrado no eSocial.
Veja a decisão da Juíza da 2ª Vara Cível Federal de São Paulo, que autorizou a Centauro a pagar o INSS com créditos de PIS e Cofins referentes à exclusão do ICMS da base de cálculo dessas contribuições. A decisão liminar foi publicada no dia 18/01/2021.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Justiça Federal de Primeiro Grau do Estado de São Paulo. Mandado de Segurança Cível nº 5021593-13.2020.4.03.6100. 2ª Vara Cível Federal de São Paulo. São Paulo, 18 jan. 2021.
______. Lei nº 9.430 de 27 de dezembro de 1996. Dispõe sobre a legislação tributária federal, as contribuições para a seguridade social, o processo administrativo de consulta e dá outras providências. Brasília, DF, 30 dez. 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCiVil_03/LEIS/L9430.htm#art74>. Acesso em: 26 jan. 2021.
______. Lei nº 11.457 de 16 de março de 2007. Dispõe sobre a Administração Tributária Federal; altera as Leis nos 10.593, de 6 de dezembro de 2002, 10.683, de 28 de maio de 2003, 8.212, de 24 de julho de 1991, 10.910, de 15 de julho de 2004, o Decreto – Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e o Decreto no 70.235, de 6 de março de 1972; revoga dispositivos das Leis nos 8.212, de 24 de julho de 1991, 10.593, de 6 de dezembro de 2002, 10.910, de 15 de julho de 2004, 11.098, de 13 de janeiro de 2005, e 9.317, de 5 de dezembro de 1996; e dá outras providências. Brasília, DF, 19 mar. 2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCiVil_03/_Ato2007-2010/2007/Lei/L11457.htm>. Acesso em: 26 jan. 2021.
______. Lei nº 13.670, de 30 de maio de 2018. Altera as Leis nº s 12. 546, de 14 de dezembro de 2011, quanto à contribuição previdenciária sobre a receita bruta, 8. 212, de 24 de julho de 1991, 8.218, de 29 de agosto de 1991, 9.430, de 27 de dezembro de 1996, 10.833, de 29 de dezembro de 2003, 10.865, de 30 de abril de 2004, e 11.457, de 16 de março de 2007, e o Decreto-Lei nº 1.593, de 21 de dezembro de 1977. Brasília, DF, 30 mai. 2018. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCiVil_03/_Ato2015-2018/2018/Lei/L13670.htm>. Acesso em: 26 jan. 2021.
______. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa nº 1.717, de 17 de Julho De 2017. Brasília, DF, 18 jul. 2017. Disponível em: <https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/19182789/do1-2017-07-18-instrucao-normativa-n-1-717-de-17-de-julho-de-2017-19182499>. Acesso em: 26 jan. 2021.
______. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa RFB nº 1810, de 13 de Junho de 2018. Brasília, DF, 14 jun. 2018. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=92690>. Acesso em: 26 jan. 2021.
______. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Solução Consulta DISIT/SRRF04 nº 4.029, de 15 de dezembro de 2020. Brasília, DF, 17 jun. 2020. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=114387>. Acesso em: 26 jan. 2021.
Juíza permite compensação cruzada de créditos anteriores ao eSocial. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2021-jan-19/juiza-autoriza-centauro-pagar-inss-creditos-pis-cofins>. Acesso em: 27 jan.2021.
ESCRITO POR ANA BEATRIZ DA SILVA
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